As pessoas jurídicas empregadoras, ao disponibilizarem ou quitarem verbas salariais devidas a seus colaboradores, são obrigadas a provisionar e a recolher encargos tributários sobre elas incidentes, apuradas, portanto, sobre a folha de salários, quais sejam: as contribuições previdenciárias e as destinadas aos denominados terceiros.
As contribuições destinadas aos chamados terceiros englobam as contribuições ao Salário-Educação, ao SESI/SESC/SEST, ao SENAI/SENAC/SENAT, ao SEBRAE e ao INCRA, não necessariamente imputadas a todos os empregadores, cujas alíquotas, estabelecidas por código FPAS, encontram-se bem resumidas na tabela constante do Anexo II da Instrução Normativa RFB (IN-RFB) nº 971/09, com redação atual prevista na IN-RFB nº 1.867/19, variando, caso a caso, com alíquotas somadas de 2,7% (dois inteiros e sete décimos percentuais) a 5,8% (cinco inteiros e oito décimos percentuais).
Portanto, atualmente, todos os empregadores incorrem em encargos tributários que, incidentes sobre a totalidade da folha de salários (mesma base de cálculo das contribuições previdenciárias), são destinados ao custeio das entidades que integram o chamado ‘Sistema S’, do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, do SEBRAE e do INCRA.
Desta forma, a totalidade da folha de salários, de uma maneira geral, observadas as deduções de verbas que não sofrem tais incidências (previstas no art. 28, § 9º, da Lei nº 8.212/91, e suas posteriores alterações), serve de base de cálculo para a apuração de todas as contribuições que incidem sobre a folha de salários, indistintamente.
A totalidade da folha de salários, contudo, nem sempre foi a base de cálculo das contribuições incidentes sobre a folha de salários, já que a Lei nº 6.950/81, ao unificar a base de tributação das contribuições previdenciárias e daquelas arrecadadas aos terceiros, estabeleceu-lhes um limite máximo para suas apurações, limitando a base de cálculo das contribuições aludidas ao montante de até 20 (vinte) vezes o maior salário mínimo vigente no País, tal como se infere da regra de seu art. 4º, com teor legal reproduzido a seguir:
Art 4º. O limite máximo do salário-de-contribuição, previsto no art. 5º da Lei nº 6.332, de 18 de maio de 1976, é fixado em valor correspondente a 20 (vinte) vezes o maior salário-mínimo vigente no País.
Parágrafo único – O limite a que se refere o presente artigo aplica-se às contribuições parafiscais arrecadadas por conta de terceiros.
Com a referida norma legal, aliás, o legislador brasileiro, à época, consolidou regra pela qual não só as contribuições ao SESI/SESC e ao SENAI/SENAC teriam a mesma base de cálculo das contribuições previdenciárias, já que assim encontravam-se previstas no art. 1º do Decreto-lei nº 1.861/81, mas todas as contribuições classificadas como parafiscais (incluindo, portanto, Salário-Educação e INCRA), as quais incidiriam sobre a folha de salários, observando-se o teto máximo da base de cálculo equivalente a até 20 (vinte) salários mínimos vigentes em cada período de apuração.
É verdade que o referido teto limite da base de cálculo das contribuições incidentes sobre a folha de salários foi extirpado da ordem normativa pátria, tanto que a exigibilidade de todas as contribuições previdenciárias e destinadas aos terceiros vem sendo calculada sobre a totalidade da folha de salários.
Contudo, quando o referido teto limite de base de cálculo das contribuições incidentes sobre a folha de salários foi excluído do mundo jurídico, o que se deu com o advento do Decreto-lei nº 2.318/86, a retirada da referida trava à base de cálculo não se produziu em relação a todas as contribuições aludidas, tal como se observa da redação do art. 3º do citado Decreto-lei, com teor normativo reproduzido a seguir:
Art 3º. Para efeito do cálculo da contribuição da empresa para a previdência social, o salário de contribuição não está sujeito ao limite de vinte vezes o salário mínimo, imposto pelo art. 4º da Lei nº 6.950, de 4 de novembro de 1981.
A propósito e por conta disso, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), em recente Acórdão que coube à Relatoria do Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, proferiu decisão unânime, em sua 1ª Turma, pela qual reconheceu, de forma expressa, que as contribuições ao Salário-Educação e ao INCRA continuariam sujeitas à trava da base de cálculo estabelecida na norma do art. 4º, parágrafo único, da Lei nº 6.950/81, já que a norma legal do art. 3º do Decreto-lei nº 2.318/86 só estabeleceu a supressão do teto limite às contribuições previdenciárias, limite aquele, portanto, mantido às contribuições ao Salário-Educação e ao INCRA, como bem se observa da ementa do AgInt no REsp nº 1.570.980/SP, reproduzida a seguir:
TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL DEVIDA A TERCEIROS. LIMITE DE VINTE SALÁRIOS MÍNIMOS. ART. 4º DA LEI 6.950/1981 NÃO REVOGADO PELO ART. 3º DO DL 2.318/1986. INAPLICABILIDADE DO ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ. AGRAVO INTERNO DA FAZENDA NACIONAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
1. Com a entrada em vigor da Lei 6.950/1981, unificou-se a base contributiva das empresas para a Previdência Social e das contribuições parafiscais por conta de terceiros, estabelecendo, em seu art. 4º., o limite de 20 salários-mínimos para base de cálculo. Sobreveio o Decreto[-lei] 2.318/1986, que, em seu art. 3º., alterou esse limite da base contributiva apenas para a Previdência Social, restando mantido em relação às contribuições parafiscais.
2. Ou seja, no que diz respeito às demais contribuições com função parafiscal, fica mantido o limite estabelecido pelo artigo 4º., da Lei nº 6.950/1981, e seu parágrafo, já que o Decreto-Lei 2.318/1986 dispunha apenas sobre fontes de custeio da Previdência Social, não havendo como estender a supressão daquele limite também para a base a ser utilizada para o cálculo da contribuição ao INCRA e ao salário-educação.
3. Sobre o tema, a Primeira Turma desta Corte Superior já se posicional [sic] no sentido de que a base de cálculo das contribuições parafiscais recolhidas por conta de terceiros fica restrita ao limite máximo de 20 salários-mínimos, nos termos do parágrafo único do art. 4º. da Lei 6.950/1981, o qual não foi revogado pelo art. 3º. do DL 2.318/1986, que disciplina as contribuições sociais devidas pelo empregador diretamente à Previdência Social. Precedente: REsp. 953.742/SC, Rel. Min. JOSÉ DELGADO, DJe 10.3.2008.
(…).
5. Agravo Interno da FAZENDA NACIONAL a que se nega provimento.
(Os destaques não constam do original.)
Desta feita, o STJ se posicionou, de forma expressa e assentando que a matéria tem entendimento consolidado na 1ª Turma daquele Tribunal, que as contribuições ao Salário-Educação e ao INCRA somente podem incidir sobre o limite máximo de 20 (vinte) salários mínimos mensais de salários/remunerações pagas pelos empregadores a seus empregados/colaboradores, entendimento este que nos permite concluir que estão equivocados os recentes julgamentos que estão sendo emanados no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, segundo os quais, revogado o caput do art. 4º da Lei nº 6.950/81, seria-lhe consequente a revogação de seu parágrafo único, tal qual assenta, p. ex., o Desembargador Federal Rômulo Pizzolatti, em recente Decisão no AI nº 5012302-26.2020.4.04.0000, datada de 1º de abril de 2020, com trecho reproduzido a seguir, e cujo entendimento vem sendo reiterado nas diversas decisões deste Tribunal Regional sediado em Porto Alegre/RS:
(…)
De mais a mais, seria despropositado entender que, revogada a norma (principal) que estipula determinado limite (ou seja, o caput do art. 4º da Lei nº 6.950, de 1981), a extensão (acessório) desse limite (ou seja, o parágrafo único do art. 4º da Lei nº 6.950, de 1981) permanecesse vigente. É sabido que, inclusive no âmbito jurídico, o acessório segue a sorte do principal.
Aliás, assim pensamos em razão de que o art. 3º do Decreto-lei nº 2.318/86, diferentemente do que vem decidindo o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, não revogou o art. 4º, caput, da Lei nº 6.950/81, mas sim estabeleceu que o limite disposto no art. 4º desta Lei não se faz mais aplicável ”para efeito de cálculo da contribuição da empresa para a previdência social”.
Por conseguinte, pensamos que a propositura de ação judicial visando a discussão das contribuições ao Salário-Educação e ao INCRA, em especial sua exigibilidade sobre base de cálculo que supere 20 (vinte) salários mínimos mensais, possa ser medida interessante visando a redução dos encargos tributários que vem onerando a folha de salário das empresas, em especial em um momento de crise na área da saúde e, consequentemente, econômica que atualmente vivemos, principalmente diante do entendimento jurisprudencial do STJ antes indicado.
Outrossim, devemos observar que não obstante a decisão do STJ, exarada no AgInt no REsp nº 1.570.980/SP, esteja a tratar, genericamente, das contribuições destinadas a terceiros, pensamos que o entendimento jurisprudencial não deverá alcançar, ao seu final, as contribuições ao SESI/SESC/SEST, ao SENAI/SENAC/SENAT e ao SEBRAE (contribuições estas que não se encontram expressamente referidas no Acórdão do STJ), ainda que alguns artigos e decisões judiciais estejam a lhes aplicar o entendimento jurisprudencial firmado no STJ, pois que quando do advento do Decreto-lei nº 2.318/86, seu art. 1º, inciso I, expressamente revogou o teto limite aludido para as contribuições ao SESI/SESC e ao SENAI/SENAC à época existentes.
Não obstante, pensamos que o referido entendimento jurisprudencial paradigma há de alcançar a contribuição ao Salário-Educação atualmente cobrado com base na Lei nº 9.424/96, ainda que algumas decisões judiciais estejam excluindo esta contribuição do alcance decisório proferido no AgInt no REsp nº 1.570.980/SP, tal como se observa da decisão na ação nº 5003206-47.2020.4.03.6100, pois que a Lei nº 9.424/96, ainda que tenha redigido o critério quantitativo da contribuição ao Salário-Educação, apenas referendou norma antes existente, sem revogar, portanto, o limitativo de sua base de cálculo previsto no art. 4º, parágrafo único, da Lei nº 6.950/81, cuja regra limitativa, portanto, permanece válida ao atual regime tributário da contribuição ao Salário-Educação.
Desta forma, podemos concluir que o entendimento judicial exarado no Acórdão do AgInt no REsp nº 1.570.980/SP pode proporcionar às pessoas jurídicas a redução futura e, por conseguinte, a recuperação dos indébitos das contribuições ao Salário-Educação e ao INCRA que, nos últimos 5 (cinco) anos, tenham sido pagas e que estão a incidir, às alíquotas de 2,5% (dois e meio por cento) e de 0,2% (dois décimos percentuais), respectivamente, sobre o montante da folha de salários que tenha excedido e que extrapole o montante de 20 salários mínimos mensais, cujos esclarecimentos mais detalhados poderemos prestar caso assim se faça necessário.